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3000 – Rumos do tempo.

Que rumo tomamos? É esta a pergunta que me faço. Vejo em nosso presente, enquanto escrevo, no final do terceiro mês deste ano de 2021 que pouco sabemos do que será, e para onde nos levará esta terceira década do terceiro milênio. Não há vidência nisso! Ao contrário. Pouco sabemos, pois o próprio desejo e a expectativa de um futuro melhor se apaga. Vemos seu despontar com amargura. Um mal estar generalizado, seguido da sensação de vertigem como se centenas de milhares de corpos pairassem no ar. E parece que a história nos observa. Simplesmente está aí, agora, como tudo que acontece. As pessoas sentem e a história e ela é percebida em um constante estado de tensão e medo distribuído, ansiedades e depressões acumuladas nas gentes. Acúmulos de uma tragédia assistida, que já podem ser vistas em retrospecto. No trágico da transição das décadas, estremecemos em um transe temerário que nos impossibilitou de dar um simples passo à frente sem sentir-se rumo ao vazio. Um rumo “perdido” de quem caminha para frente no escuro sem ver o chão.

“Tem que arrumar uma saída pra esse inferno que a gente vive e ainda tem que sair vivo, esse é o problema. “ – minha mãe

“Isso é um hospício” – o vizinho

Não há uma só solução aparente no futuro por ele mesmo, e a expectativa não deve estar muito presente entre a maioria de nós. Talvez, e esta é a minha esperança, perceberemos a partir de agora o passado com um outro olhar. Regredindo a um momento, em que, lá no passado, o futuro fosse uma coisa totalmente diferente da que vivemos hoje. Mas qual o sentido disso? Onde estávamos há 10 anos atrás? Quais eram nossas alegrias? Falando daqui, na superfície deste país brasileiro, das coisas brasileiras, com gente brasileira, onde estou, sou e me movo, caminho e vejo as coisas acontecendo, me pergunto: em que direção estávamos antes? Quantos caminhos se cruzaram Não sei, parecia bem melhor. Com uns 15 anos bem vividos conseguia imaginar um futuro qualquer animado e esperançoso. Assistia à primeira Copa do Mundo no continente africano como todos. De alguma forma, o que se dava para entender é que as coisas até ali se transformaram com rapidez, e pareciam prosperar. Na política, a governança popular de Lula lhe garantiu ao final do mandato de presidente com 80% de aprovação. A continuidade da bonança era esperada também no mandato de Dilma, que se encerraria em festa, com a chegada da Copa do Mundo ao Brasil em 2014. Mas o que aconteceu foi bem diferente.

Uma imagem manchada foi projetada no cenário público. As ruas, vistas ao avesso, reviram a cena histórica e naquele tempo já se colocava todo o legado do petismo sob júri da opinião popular e da mídia. A má administração econômica não repetiu os feitos de crescimento real dos anos anteriores. E os efeitos da crise de 2008 tornaram-se nítidos. Este foi um fator de incômodo para diferentes setores da sociedade, mas foi principalmente nos setores da classe média emergente que ela se destacaria entre a população e a opinião pública. Parte dessa opinião se mostrou muito preocupada não só em criticar a política econômica mas sobretudo em questionar a legitimidade das pautas sociais do governo. As cotas raciais, as políticas, fortalecimento dos direitos trabalhistas, expansão do bolsa família, as obras do PAC, o ensino de história da África nas escolas. A expansão das vagas nas escolas e universidades públicas. Todos esses projetos de governo eram vistos como práticas de aparelhamento do Estado por valores contrários aos da sociedade brasileira “conservadora-liberal-cristã”.

Daí até a intervenção do conservadorismo em defesa da família tradicional brasileira e dos bons costumes foi um pulo. Este movimento libertou os monstros que a muito tempo se encontravam enterrados. Verde-amarelistas, nacionalistas de última hora, ganharam nova roupagem com velhos jargões e marchas coreografadas da “boa sociedade”, onde estavam robôs, zumbis e homens de bens. Tiozões que já não se envergonhavam de suas ideias, motivados por um sentimento de revolta e justiça social que entupiam os noticiários. O ódio se propagava. De um lado, poucos querendo muito. Do outro, milhares querendo mais ainda. O desejo, moveu os padrões de consumo ao colapso. A moda dos smartphones, dos carros financiados, das viagens de avião, do parcelamento no cartão de crédito foi o acesso a um produto de status para uma boa parcela da população brasileira que começava a se ver como mais distinta. Dignos da prosperidade, a nova classe média cerrava o palco político como um novo ator. Ativo principalmente nas redes sociais e ressoando os discursos do neoliberalismo em defesa do capitalismo e de uma sociedade de livre mercado. Este desejo movimentou a reação violenta de milhares que acostumados aos programas policiais apontaram para as raízes do crime comum, cotidiano, com o olhar punitivista. Eram os que diziam “Direitos humanos para humanos direitos!” e coisas do tipo. “Tropa de Elite” deu um novo sentido à espetacularização das incursões da polícia carioca nas favelas. Crescia a crise e um desejo de expurgo dividiu a sociedade brasileira em duas facções. Uma oposição que até agora se mostrou inconciliável. Entre coxinhas e mortadelas o Brasil foi ficando para trás. Afastados escolheram estar e afastados ficaram.

Nada disso teve origem em grande acordo nacional algum. Mas fez parte. Alimentando o resultado real de um desacordo já generalizado em que acusações de ambos os lados se perdiam na busca inútil de vitória. Para que? A essas tantas com um Impeachment, não sabia mais para onde ir. E a conversa já tinha um tom pesado. Acusações de ambos os lados. Chumbo trocado em diferentes cenários. Nas ruas a mudança dos ventos já se sentia ao arrepio. E ficou escancarado no dia 14 de março de 2018 com o assasinato político da vereadora Marielle Franco. Mulher negra, mãe, lésbica, periférica. Crime que tinha tudo para ser esquecido. Como milhares deste tipo são esquecidos. Seus algozes planejavam o silêncio. Um silêncio que na verdade é vivido cotidianamente num país como o Brasil. O país foi se acostumando a assistir mais e mais mortes como essa, e foi se consumindo no ódio. Um ódio oportuno que surgia num fundo de sala. Um ódio que se justificava absurdos.

Ninguém mais se escutava. E aqueles gritos ficaram mais nítidos. Ressoavam um coro, clamoroso por uma salvação fácil, por um Messias. Escolheram logo quem. Logo aquele que exaltou tantas vezes a tortura. Que mentiu tantas vezes. Que começou pela mentira e seguiu com a violência, desejando o poder. Na origem do seu nome político corria solta a ficha do ganancioso. Aproveitou-se fácil da situação. Com a crise e o ódio, seus absurdos foram propagados como alternativas sãs. Como uma alternativa, “uma escolha difícil” “Contra tudo isso que tá ai! Ta, ok?”. Com a condenação do PT, e o sentenciamento de Lula na operação Lava Jato. O caminho ficou aberto para a sua chegada. Bradavam a ele, agora o incorruptível. O mito das mulas. O absurdo ganhava corpo com a disparada da sua candidatura como presidente. Movida a kit-gay e grupos de whatsapp. Além de uma facada que tomou sem sangrar.

Daí em diante seu discurso era uma ode às memórias do tirano populista. E suas aspirações as mais espúrias. Tomada a posse, logo tratou de fazer seu governo às avessas. Causar intencionalmente atritos entre instituições e interesses. A ameaçar a imprensa. Certamente se sentia no poder. E ao seu redor formava um corpo ministerial herdeiro da mística da “Revolução de 64” conhecida por nós como Ditadura Civil-Militar (1964-1985). Poderia ter sido esse o signo do seu mandato. Um mero regresso conservador que se fundou de um golpe e se inspirou em outro golpe para governar. A fórmula era a mesma. A defesa da liberdade contra o fantasma do socialismo. O crescimento econômico a qualquer custo. Ao custo real de uma sequências de reformas. Ao custo das aposentadorias e das carteiras de trabalho de milhares de brasileiro. Seu projeto? Poder, poder e mais poder. Custe o que custar. Com Deus ou Brasil ou sem eles se precisar.

26 de fevereiro de 2020.

Primeiro caso de Covid-19 registrado no Brasil. A pandemia de Covid-19 atinge o Brasil. O governo, suas medidas, flagrante descaso. E a cada dia o número de novos casos ia aumentando. E os somando ao início tínhamos a esperança de algum controle. E a perder de vista foram se multiplicando cada vez mais. Vossa excelência, o presidente, acostumado com o seu cercadinho no planalto seguia com o menosprezo habitual. Verdadeiramente preocupado apenas em salvar seus filhos envolvidos em esquemas de corrupção das denúncias que já batiam à sua porta com as crises sucessivas que produziu. Esgarçando mais e mais o tecido das instituições para manter a força do seu discurso. Força da agitação política, do ódio, do uns contra os outros.

Rumo de um pesadelo perverso.

Quando paramos de somar os casos diários, passamos então a somar corpos. 100, 200, 300, 400, 800 por dia. Somamos, e seguimos somando. E ele, já podre por dentro, seguia o plano do ódio, da negação. “Idai?” Quantas vezes fosse necessário, ele diria. Sem auxílio estimulou a população a não se proteger do vírus, a não usar máscaras, a usar medicamentos inadequados ao tratamento. Estimulou a volta ao trabalho, a normalidade impossível. Impossível pois os hospitais estavam abarrotados de gente sufocando nas UTIs. E ele, a besta inominável, sequestrava para si o futuro. Querendo conquistá-lo pela força. Aspirante a ditador, amante das frases de Porfírio Diaz, em transe. Seus olhos vidrados sobre o domínio e gritava antes do fim “pela harmonia universal dos infernos, chegaremos a uma civilização!”.

Este transe da terra brasileira se acelera mais e mais. 2020 foi um ano que ficou. Quase que não aconteceu. Foi esquecido ou se entendeu a 2021. Ainda não sabemos. O rumo que tomamos, foi esse. O calendário anda pra frente. Passamos, acreditamos passar por ele. Começou a terceira década do terceiro milênio. Para onde vamos, que rumo tomamos? Esquecemos nossas utopias?

Peabiru 3000 é uma metáfora sobre este não-lugar. Onde a história se passa ao arrepio da nossa sombra e pode custar nossas vidas. Peabiru não é a resposta, mas uma busca por esses caminhos. Trilhas possíveis para longe desses dias em que muitos se vão e ele não.

3.950

3.780

318.000

Nena

Espero que entenda

Minha vocação é o sacerdócio

A lua tem o meu juízo

Acrescente

Sou 3

O que foi

&

O que espera

Entre eles

Não sou nada

A não ser

O mistério do corpo e do tempo

Por Ademas Pereira @guaiamonk

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