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Quando somos marginalizados, invisibilizados, massacrados e descartados por uma máquina estatal que detém o monopólio da opressão e da violência "legítima", não podemos esquecer, jamais, quem somos nós. 

Weber foi categórico ao afirmar que se uma pessoa age com violência no meio social, ela será considerada criminosa, ao passo que, em circunstâncias específicas, um agente do Estado pode usar de violência legitimamente. 

Quem sofre sabe que de legítima só os traumas, medos e marcas que às vezes nunca saram, e que as circunstâncias específicas na sua maioria são fatais, não se pode brincar com a corporação especialista em moer negros e pobres. 


"Quem sou eu? BXD!" nasceu de um sonho, em um lugar onde até para sonhar precisamos enfrentar centenas de obstáculos. Em busca de um sonho coletivo de trazer cultura e educação para a Baixada Fluminense, o arte educador Igor Maia (@instaigmaia) criou o movimento sem fins lucrativos, buscando trazer mais cultura e educação para crianças e adolescentes das favelas das terras fluminenses. 


Na primeira tentativa de dar vida ao seu projeto, o estado o impediu através do seu monopólio legítimo da força, transformando as vítimas em criminosos, invadindo com fuzis um evento cultural e educativo. Crianças correndo, convidados assustados, um sonho frustrado, uma legítima sensação de medo, consequência de se atrever a sonhar, onde o que impera é a realidade. 

Fui parar em São João de Meriti, terrinha onde morei boa parte da minha vida, que teve a honra de sediar o "Festival Quem sou eu? BXD!" que ocorreu no Gato Negro Pub em Jardim Meriti, local de resistência cultural em SJM, resistindo há 9 anos e abrindo suas portas para a cultura da BXD. 


No festival, apresentaram-se Rojão, Valen, MC Carina, Zaak DC, Kallia, Oliver, Caroline Verçosa, Coimbra, todos artistas sensacionais, que transformaram a noite em um espaço de resistência, força e ancestralidade. Além da música, houve arte, com a exposição dos artistas visuais Wellerson Cesar, Andressa Gandra e Brayan, que embelezaram o espaço com suas artes. 

O evento foi tão incrível que fiquei curioso para saber mais sobre o movimento "Quem sou eu? BXD" e sobre esse festival que ocorreu em parceria com o Gato Negro Pub. Esse rolezinho rendeu um minidoc e uma entrevista com o seu idealizador Igor Maia, que nos contou como foi todo o processo de materialização dessa ideia.

Como surgiu a ideia de criar o Festival “Quem sou eu? BXD!” e qual foi a inspiração por trás desse nome?


A ideia do festival veio das artistas Carina Mc, Kallia e Ericka Mendonça (produtora do Gato Negro Pub) As duas foram convidadas por Ericka para cantar no pub e deram essa ideia de trazer o “Quem sou eu? bxd?” Por não rolar os shows que elas cantariam no dia 03/12/2023 que acabou não acontecendo devido à truculência do Poder Público. 

O nome surge do questionamento de quem somos perante a sociedade? Como somos vistos? Com a turbulência que vivemos, facilmente esquecemos quem somos. Por isso, é importante saber quem somos para nos direcionar para onde vamos. A ideia do festival é fortalecer a cultura da Baixada Fluminense, trazer artistas da Baixada e dar voz para os mesmos, para que outros conheçam quem eles são e se autoquestionem quem são!


Qual foi o objetivo principal do festival e você acha que ele foi alcançado?


O objetivo sempre será trazer arte e cultura da favela. Sim, todos os artistas que toparam se apresentaram e contribuíram com suas manifestações artísticas, com muita música e arte visual com a exposição que rolou. 


Pode nos falar um pouco sobre a parceria com o Gato Negro Pub e como essa colaboração contribuiu para o sucesso do evento?


A falta de grana e falta de espaço são os maiores desafios do Projeto “Quem sou eu? Bxd”. Poder Utilizar aquele espaço para nos apresentarmos e fazermos o que viemos no mundo para fazer é o maior ato de união e amor, para além do que o dinheiro compra. Essa parceria, intuída pela própria espiritualidade, me fez abrir os olhos para novas possibilidades, para mais festivais como esse. Acredito que quando o propósito é de coração o universo conspira a favor. Sou eternamente Grato por nos receberem. 


As exposições artísticas de Wellerson Cezar, Andressa Gandra e Brayan tiveram papel fundamental no festival. Como você escolheu esses artistas e qual foi a reação do público às exposições?


Sou fã do trabalho de cada um, esse é um dos critérios das escolhas dos artistas. Todos são artistas periféricos, Wellerson é cria de Belford Roxo e Brayan BC cria de São João, e Andressa Gandra que é da Pavuna. A reação do público sempre é incrível, pois os artistas retratam suas obras com inspiração em suas próprias vivências parecidas com a vivência de seus espectadores. Com isso, o público ama se ver em suas telas, ampliando o sentido de que a arte não é só para elite, é para todes! 


O lineup de shows apresentou uma diversidade de talentos locais. Como foi o processo de seleção das bandas e artistas participantes?


A lineup foi escolhida desde o primeiro evento do dia 03/12/23 e com muito amor os artistas toparam mais uma vez. O processo foi bem fácil, trazer artistas que estão se iniciando na cena e artistas que já estão na cena há algum tempo, mas que precisam desse holofote para continuarem fazendo o que amam. Os artistas que marcaram presença no festival amam o que fazem e estamos unidos por um propósito, pela arte, sendo artistas independentes sabemos o quão difícil é para botarmos nossa cara, não temos patrocínio. E artistas de forma geral precisam desse reconhecimento e enaltecimento da sua arte. 


Houve algum momento especial ou destaque durante o festival que você gostaria de compartilhar conosco?


Todos os momentos foram especiais para mim.  Poder assistir às apresentações e ver a entrega de cada um não tem presente maior, como não se emocionar?  Dois artistas são do meu bairro, Parque Juriti, São João de Meriti. Dar visibilidade para quem está na mesma correria que estou é muito gratificante. Uns dos momentos mais marcantes foi quando Rojão e a Kallia protestaram pelo ocorrido no último evento durante suas apresentações. Ter pessoas que acreditam em você, que acreditam no seu trabalho é o que me movimenta a continuar. 


Como foi a resposta do público da Baixada Fluminense em relação ao festival? Houve uma boa participação da comunidade local?


Infelizmente, foi um evento feito às pressas, tivemos um prazo de 3 semanas para produzir e se apresentar, com isso não houve tempo para divulgação e tanto retorno quanto esperávamos. Mas o que importa é que a semente foi plantada. 



Quais são os planos para o Festival "Quem sou eu? BXD!"? Podemos esperar por mais edições no futuro?


“SIMMM, CLARO!!!” Enquanto respirarmos, seremos resistências, união, ARTE, EDUCAÇÃO E MUITA LUTA. Tudo para um futuro melhor para nossas crianças e adolescentes que são carentes de cultura. Esse é somente o nosso início, aprendi com tudo até aqui e eu quero muito mais. 


Qual é a importância de eventos como esse para a promoção da cultura e arte na região da Baixada Fluminense e no cenário independente?


O projeto nasce com o intuito de intervir artisticamente na praça do meu bairro, Parque Juriti, por meio de movimentos artísticos que estão presentes na favela. Pretendo que nossas crianças e adolescentes entendam o quanto a nossa cultura de favela e da Baixada é rica. Além disso, quero que elas conheçam as potências artísticas que existem na sua comunidade e nos seus entornos, mostrando o que é possível pelo fazer artístico.


A primeira edição do festival foi interrompida devido a uma operação policial. Como essa experiência impactou você como organizador e qual é o simbolismo dessa interrupção em um evento independente na Baixada Fluminense?


Confesso que hoje, depois de quase 5 meses, ainda tenho alguns resquícios daquele dia, o dia que estava sendo o melhor da minha vida, esse projeto se trata do meu sonho, tlg? É o meu trabalho, é a minha vida, é o meu propósito e acabou sendo interrompido brutalmente. A polícia amedrontando a todos os presentes, apontando fuzis e mandando desmontar tudo, foi uma das piores sensações que eu já tive, aqueles que deveriam nos proteger, passando com a viatura por cima dos brinquedos e nos humilhando como se fossemos nada. Eu senti e sinto até hoje, só de falar. A responsabilidade de ter levado professores, artistas, país e muitas crianças para um dia que deveria ser inesquecível positivamente acabou sendo uma cena de terror. Eu surtei, fiquei muito mal durante um tempo, pensei em desistir, porque se o pior acontecesse (bala perdida) cairia sobre os meus ombros. 

O simbolismo disso tudo é: não temos DIREITO de trazer cultura, arte, alegria para a Baixada, somos violados, somos marginalizados, somos humilhados, estamos esquecidos diante da sociedade. Aconteceu o que aconteceu e eu não tenho nem o direito de dizer como eu me senti, por medo da retaliação do poder paralelo que domina grande parte do Rio de Janeiro e a Baixada. Eu me coloquei na linha de frente disso tudo e coloquei em risco os meus, em prol da Arte Educação e pelas crianças. Como continuar quando o mundo está contra você? 


Por fim, há alguma mensagem ou agradecimento que você gostaria de transmitir para aqueles que apoiaram e participaram do festival?


Eu, Igor, não sou ninguém, sou só mais um favelado que está preso a este mundo terreno que às vezes parece que não tem sentido nenhum. Mas, até os favelados têm sonhos, nós pensamos, trabalhamos, estudamos e resistimos. Um dos meus sonhos é que nossas crianças e adolescentes da Favela tenham o direito de serem o que elas quiserem ser, mesmo com o mundo ao seu redor te diminuindo e te dando poucos caminhos. Quero agradecer a todes que me apoiaram nessa luta coletiva. Fazer algo na Baixada é resistir contra o mundo que não quer que pensemos, que não quer que vençamos. Que venham mais eventos, que venham mais artistas, que venham mais crianças, estamos montando um esquadrão para a guerra! Munidos de muita união, muita arte, amor e ancestralidade. Obrigado mais uma vez pelos que acreditaram e que vocês possam continuar acreditando, porque apesar de tudo, sigo intacto e pronto para a próxima. 



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A que necessidade responderia desde então a existência de um Estado, uma vez que sua essência - a violência - é imanente à divisão da sociedade, já que é, nesse sentido, dada antecipadamente na opressão exercida por um grupo social sobre os outros? Ele não seria senão o inútil órgão de uma função preenchida antes e alhures. Pierre Clastres.

O que é o Estado, até onde ele pode ser fagocitado?


Solucionando crimes que revelam suas próprias entranhas, não como uma quimioterapia, que tenta aplacar o câncer, mas, em alguma medida, normalizando tais relações e fazendo a roda girar para que novas famílias se estabeleçam.



Aliás, quase ninguém aponta a ligação entre a família Brazão e o União Brasil com todas as suas alianças, de progressistas a conservadores.


Provavelmente, poucos vão perceber o quanto os governos de qualquer cor funcionam como um partido único, conservando o Estado por inteiro em seus jogos de marionete. Caso amplo setor da sociedade faça uma leitura aprofundada do buraco que estamos, veremos o tamanho do desafio que temos que enfrentar e que para muitos nem no horizonte esta leitura se apresenta, seja por incapacidade ou vontade de realizá-la.


Querer conservar o Estado como está, conciliando com todos, sem revirar o passado, sem mobilizar a sociedade, é desejar inconscientemente que novos crimes aconteçam, novos golpes ocorram, apenas mais sofisticados.


As associações mais nítidas que vi são: governo golpista do Temer, intervenção federal com Braga Neto, questão fundiária na Zona Oeste e o assassinato de Marielle. Há uma sucessão de acontecimentos e ligações, mas aqui quero apontar o quanto a máquina de guerra do Estado, em um movimento centrípeto, unifica todos os partidos em detrimento da governabilidade sobre as regras do jogo. 


Portanto, não podemos desvincular a não solução político-social dos crimes da ditadura e o que foi esse período, mas também sua relação com a imposição da guerra as drogas, com o aparecimento de armas e drogas nas favelas, os episódios do Carandiru e El Dorado dos Carajás, pra ficar nos mais emblemáticos, o envio de tropas para o Haiti – treinando o exército para levantes e guerra civil –, a forma como Junho de 2013 foi reprimido e é interpretado hoje, as Unidades de Polícia Pacificadora e tantas outras políticas que demonstram que o Estado unifica sobre uma bandeira, a dominação e controle do povo.


Os meios são diversos, mas a máquina de guerra é gigantesca e a violência é a substância comum.




Cotidianamente somos soterrados de informações que dizem exatamente isso, como maquinário é tão grande que podemos sumir com armas de quartel, um equipamento de cigarros que pesa toneladas de dentro da cidade da polícia, ou vigas gigantescas de uma perimetral e tudo continuar funcionando, pois este é o normal.


Sobre os meios diversos, dizemos respeito as formas que o Estado aplica a violência sobre a população e o jeito mais eficiente tem sido a forma indireta – ou seja, não é a justiça burguesa, mas o guarda da esquina, o traficante, o matador de aluguel, o jagunço, que tem e não tem vínculo com o Estado. A violência perpetrada não visa abater todos que considera inimigo, mas instaurar um clima de medo que introjetamos no nosso dia a dia e é aqui que eu queria chegar. Esse medo, que nos circunda ao andar na rua, pegar um ônibus é o que está na origem de certos posicionamentos políticos.


Negar a retomada dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, ou até mesmo o repúdio ao golpe para não haver tensionamentos é, por medo, empurrar com a barriga o problema fundacional desse Estado, é aceitar que o golpe, do passado e do futuro, regule a ação política do presente. Só que, em determinado momento, o medo, sentimento justo e natural, se torna postura política, acarretando coparticipação da bala que sai do fuzil e atravessa corpos negros.



Esse emaranhado de relações sociais violentas, particularmente racista, é a base fundamental da fundação desse Estado, que sempre se deu de maneira a confundir o legal e ilegal. Ou seja, participar do jogo institucional do Estado e não contra ele, é cooperar para seus diversos meios de operação de guerra contra o povo.


Aqueles que ousaram tentar contra ele, em sua razão de ser e existir, a saber, terra e território, encontra sua verdadeira face, a morte.


Como não há outro caminho, encaremos  até aprendermos a verdadeira lição, sua destruição completa.

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Cria de Madureira, Riot Molotov possui 21 anos de pura agressividade e irreverência. A cada som lançado dá pra ver muito bem essa carga, rajando letras cheias de ódio com rimas explícitas e debochadas. Seu repertório tem relação direta com a cultura punk, com pedradas tipo “DEGOLAR”, “FAKE ANTIFA” e “ZN KILLA”.

A artista da Zona Norte conversa com a Menó sobre seu mais novo EP, Enviada do Inferno, e um pouco sobre sua carreira:



— Por que Riot Molotov? Como surgiu o vulgo?



Riot Molotov existe desde que eu tinha meus 13 anos na época mais punk da minha vida. Riot vem de “revolta” e também do movimento punk feminista riot grrl, o molotov vem pelo fato da minha personalidade explosiva mesmo. Eu não levo desaforo pra casa, eu não consigo guardar algo pra mim ou ser falsa, então acabo explodindo.



— Quando começou a fazer música? Fale um pouco sobre o seu início de carreira.


Eu faço música desde 2020, sou DJ e como rapper comecei em 2021 me aventurando no hardtrap, queria ser a única mina do Rio de Janeiro fazendo um som pesado pois eu estava cansada de ver o que a cena daqui oferecia. Queria ver meninas mais agressivas e não cantando sobre roubar o macho dos outros.


— Acho difícil não pensar nas suas referências de metal e punk no seu som. Quais são as mais presentes na sua estética?


Eu diria que o punk com certeza, pois é o punk que me acompanha e acompanha minha personalidade, apesar de também gostar bastante de metal, minha musicalidade e personalidade é bem mais punk.

— Vejo que lançou um EP agora, Enviada do Inferno, que é inteiro feito no jersey club. Como foi fazer esse trabalho?



Enviada Do Inferno foi algo totalmente feito pensando em ser único e também dançante, algo que se toque até nas raves ou pra você treinar ouvindo. Mostrando todas as faces e versões de mim, eu sou agressiva mas também gosto de dançar. Nesse ep reuni violência, sentimentos pessoais e MUITA dança, foi como “vocês querem música sem gritar? tem aqui também, mas eu não vou mudar”.


— Se você pudesse mostrar um som seu da sua discografia para alguém que não sabe quem é você, que som você recomendaria e por quê?


Com certeza eu escolheria Assassina de Vadias, do ep Killa Most Wanted. Recomendaria falando “ouve e apenas sinta essa música”. Como todas as escritas são catárticas, é minha forma de não sair matando alguém e sim soltando todo esse ódio num microfone.

— Deixe um recado ou uma mensagem que queira falar para o pessoal que acompanha a Revista Menó.

Quero agradecer a Revista Menó pela oportunidade de estar aqui falando um pouquinho do meu trabalho, me acompanhem nas plataformas, pois vou estar lançando coisas únicas e originais, e sempre dando o meu melhor para diferenciar a cena brasileira. Eu vim para mudar TUDO.


A Revista Menó agradece pela confiança e deseja tudo de bom para o futuro da Riot Molotov. Siga ela no Instagram e ouça todos os sons nas plataformas digitais.


Insta da Riot: @riotmolotov

Direção e entrevista: Pedro Santos (@acordapedrinh0)

Revisão: Carlos Douglas (@cdouglasmartins)

Design: Iago Menezes (@visualbypivete)

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