Vivência Crônica - Carnaval, Galinho Chicken Little e Jesus
- O Seu Absurdo

- 20 de out.
- 4 min de leitura
Se você acha que já viu de tudo no Carnaval, sabe de nada, inocente!

Era domingo antes da semana do carnaval, o que fazia dele, o domingo da semana pré carnaval, que não deve ser confundida com a semana do pré-pré carnaval, ou com a semana do pós-carnaval, ou até mesmo com a semana do “É carnaval ainda?”. A resposta é sempre sim.
Pouco eu me lembro desse dia, mas afirmo categoricamente que muito vivi. Começou tudo na normalidade, era um bloco lá no Centro, o nome eu não sei, mas tinha banda e gente suada. E se banda e gente suada faz um bloco, todo show de rock também é carnaval, fiquem avisados.
Tava com um bonde de uma amiga minha, só galera gente fina. Já começamos na cerveja porque o calor é aquela coisa né. Um natural pra combinar, e o tratado do caos tava assinado. Logo mais adiante conheci o tal do Xeque-Mate, bom, mas caro. Entretanto, quem conhece o Rio sabe que ele tira, mas também dá.
Um brother vendendo bebida viu a mesma coisa que eu, uma plaquinha roxa no alto vendendo um doce batizado, ou algo do tipo. E tava lá escrito: "Maciota". Eu falei pra mina com a placa “Veio de Maciota é?”. Ela sem entender nada, me encarou como um indigente.
Tem momentos na vida que decisões são tomadas, ali eu tomei uma depois de tomar várias. Vou eu e grito uma parada que fora do contexto ficaria estranho pra qualquer um.
“Ô cafetão!”

E eu não sei se você sabe, mas sair por ai gritando “cafetão” é considerado deselegante. Mas antes que todo mundo pudesse me olhar indignado, vira o vendedor do meu lado pra me salvar, e começa:
“Um cafetão…” eu já me uno a ele “...chamado MACIOTA!”
Agora a conversa é entre nós, dois missionários da palavra sagrada de uma animação controversa. E voava de lá pra cá as frases de quem conhece a série, e quem sabe sabe, que não é Maciota, é Um Cafetão Chamado Maciota.
Trocamos ideia mais um pouco, o bloco tava seguindo e o fluxo era único e lento. Acabou meu Mate, e o mano me deu um desconto no Xeque. Firmeza demais.
Eventualmente, depois de um período de tempo indeterminado, porque bêbado não tem linha temporal, a gente foi parar na Pedra do Sal, como eu não sei, só sei que foi assim.
Tava tocando só as clássicas lá, e naquela altura do campeonato eu tava tão avariado que se tocasse Xuxa eu ia perder a linha. (Tocou Xuxa e eu perdi a linha)
E aí surge ele, a sombra de um passado inesquecível, o arauto do caos em forma de um galináceo carnavalesco, o Galinho Chicken Little.

Pra quem não conhece, o Galinho Chicken Little é um filme ai dos anos 2000 que volta e meia passava na sessão da tarde. Se era bom eu não sei, mas eu gostava, até porque senso crítico não é o forte de criança, nem da maioria dos adultos se for parar pra pensar.
Eu fiquei fã instantaneamente daquele maluco. Se você não soubesse do que se tratava, dificilmente tu ia adivinhar, mas minha memória é meio maluca e seletiva. Eu não lembro o aniversário de ninguém, mas um desenho aleatório de duas décadas atrás? Conte comigo.

Sente o drip do cara: Camisa verde listrada, bermuda marrom, um bico alaranjado daqueles que criança faz com cartolina na aula de artes, e COBERTO com o que eu só consigo imaginar serem litros daquele corretor branco que a gente usava no ensino médio pra apagar nossos erros. Se ele já cometeu um erro na vida, foi corrigido alí.
O mano tava crocante.

Eu admiro até hoje o compromisso com o personagem.
Eu gritei pra ele, ele gritou pra mim, a gente se abraçou. Pouco tempo depois eu já tava todo manchado daquela merda. Ele falou que era vascaíno, eu já virei e falei “A gente é primo porra, sou Botafoguense.”, o primo dele também era Botafoguense, então tava tudo certo.
E juntos a gente cantou:
“Bebeu água? (Não!) Bebeu água? (Não!) 'Tá com sede? ('Tô!) Olha, olha, olha, olha a água mineral Água mineral Água mineral Água mineral”
Ele me contou como ele ficou triste pela gente em 2023, e se ele ficou, imagina eu. Mas comemorou comigo o 2024, porque foi merecido. Nesse meio tempo a namorada dele tava lá do lado, curtindo como dava, tendo o namorado que tem. Eu adorei aquele maluco, e espero um dia reencontrar ele.

A noite chegou, minha amiga tinha que ir pra casa, e também tava meio preocupada comigo, afinal eu já tava relâmpago marquinhos das ideias.
Fui levar ela no ponto de ônibus e vejo quem? Ele mesmo, Jesus, eu sei que você já tava questionando quando o Big J. ia chegar.

Minha amiga me carregando de um lado, a Maria Madalena dele carregando ele pro outro. Por algum motivo eu resolvi falar em inglês com o Jesus, “Jesus! Jesus!”, imagina ai como os gringo fala Jesus.
E não é que ele sabia inglês? Filho de Deus tem essas paradas, né. Ele me abençoou, eu contei pra ele algo muito pessoal que só ele vai saber o que foi.

Mas não ficamos muito tempo ali não, as duas mulheres já tavam sem paciência e arrastaram a gente embora. A gente tenta encontrar o caminho da salvação, mas sabe como é né?
Minha amiga ficou preocupada como eu ia pra casa, eu disse pra ela algo incompreensível que nenhum de nós vai se lembrar, e eventualmente cheguei em casa daquele jeito de só bêbado sabe chegar, no amor e na coragem.
O carnaval é o inferno na terra, e a gente é o capeta.








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