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O Estado é impossível



A que necessidade responderia desde então a existência de um Estado, uma vez que sua essência - a violência - é imanente à divisão da sociedade, já que é, nesse sentido, dada antecipadamente na opressão exercida por um grupo social sobre os outros? Ele não seria senão o inútil órgão de uma função preenchida antes e alhures. Pierre Clastres.

O que é o Estado, até onde ele pode ser fagocitado?


Solucionando crimes que revelam suas próprias entranhas, não como uma quimioterapia, que tenta aplacar o câncer, mas, em alguma medida, normalizando tais relações e fazendo a roda girar para que novas famílias se estabeleçam.



Aliás, quase ninguém aponta a ligação entre a família Brazão e o União Brasil com todas as suas alianças, de progressistas a conservadores.


Provavelmente, poucos vão perceber o quanto os governos de qualquer cor funcionam como um partido único, conservando o Estado por inteiro em seus jogos de marionete. Caso amplo setor da sociedade faça uma leitura aprofundada do buraco que estamos, veremos o tamanho do desafio que temos que enfrentar e que para muitos nem no horizonte esta leitura se apresenta, seja por incapacidade ou vontade de realizá-la.


Querer conservar o Estado como está, conciliando com todos, sem revirar o passado, sem mobilizar a sociedade, é desejar inconscientemente que novos crimes aconteçam, novos golpes ocorram, apenas mais sofisticados.


As associações mais nítidas que vi são: governo golpista do Temer, intervenção federal com Braga Neto, questão fundiária na Zona Oeste e o assassinato de Marielle. Há uma sucessão de acontecimentos e ligações, mas aqui quero apontar o quanto a máquina de guerra do Estado, em um movimento centrípeto, unifica todos os partidos em detrimento da governabilidade sobre as regras do jogo. 


Portanto, não podemos desvincular a não solução político-social dos crimes da ditadura e o que foi esse período, mas também sua relação com a imposição da guerra as drogas, com o aparecimento de armas e drogas nas favelas, os episódios do Carandiru e El Dorado dos Carajás, pra ficar nos mais emblemáticos, o envio de tropas para o Haiti – treinando o exército para levantes e guerra civil –, a forma como Junho de 2013 foi reprimido e é interpretado hoje, as Unidades de Polícia Pacificadora e tantas outras políticas que demonstram que o Estado unifica sobre uma bandeira, a dominação e controle do povo.


Os meios são diversos, mas a máquina de guerra é gigantesca e a violência é a substância comum.




Cotidianamente somos soterrados de informações que dizem exatamente isso, como maquinário é tão grande que podemos sumir com armas de quartel, um equipamento de cigarros que pesa toneladas de dentro da cidade da polícia, ou vigas gigantescas de uma perimetral e tudo continuar funcionando, pois este é o normal.


Sobre os meios diversos, dizemos respeito as formas que o Estado aplica a violência sobre a população e o jeito mais eficiente tem sido a forma indireta – ou seja, não é a justiça burguesa, mas o guarda da esquina, o traficante, o matador de aluguel, o jagunço, que tem e não tem vínculo com o Estado. A violência perpetrada não visa abater todos que considera inimigo, mas instaurar um clima de medo que introjetamos no nosso dia a dia e é aqui que eu queria chegar. Esse medo, que nos circunda ao andar na rua, pegar um ônibus é o que está na origem de certos posicionamentos políticos.


Negar a retomada dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, ou até mesmo o repúdio ao golpe para não haver tensionamentos é, por medo, empurrar com a barriga o problema fundacional desse Estado, é aceitar que o golpe, do passado e do futuro, regule a ação política do presente. Só que, em determinado momento, o medo, sentimento justo e natural, se torna postura política, acarretando coparticipação da bala que sai do fuzil e atravessa corpos negros.



Esse emaranhado de relações sociais violentas, particularmente racista, é a base fundamental da fundação desse Estado, que sempre se deu de maneira a confundir o legal e ilegal. Ou seja, participar do jogo institucional do Estado e não contra ele, é cooperar para seus diversos meios de operação de guerra contra o povo.


Aqueles que ousaram tentar contra ele, em sua razão de ser e existir, a saber, terra e território, encontra sua verdadeira face, a morte.


Como não há outro caminho, encaremos  até aprendermos a verdadeira lição, sua destruição completa.

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