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Dissecando o termo racismo ambiental.

Atualizado: 16 de jan.




Vocês estão prontos para essa conversa? Sai do sofá e vem colocar o dedo na ferida.


A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, associou as chuvas que atingiram o Rio de Janeiro no último sábado ao “racismo ambiental e climático”. Desde então, estamos acompanhando algumas represálias à @aniellefranco por ter usado a palavra racismo para escancarar as consequências sofridas pelas pessoas que moram nas áreas mais afetadas pelas chuvas. 






Até o momento, 11 pessoas perderam as suas vidas em consequência do temporal, centenas estão desabrigadas e outras centenas tiveram suas casas completamente alagadas, perdendo tudo o que tinham. Um cenário desesperador.


Na hora do almoço de segunda-feira, 15 de janeiro, acompanhamos, atônitos, as imagens que estavam sendo transmitidas diretamente de Nova Iguaçu, mais especificamente em Morro Agudo. 


Milhares de pessoas estavam (ou estão, até agora) na frente do Cras em busca de algum auxílio, ajuda ou direcionamento da prefeitura, na esperança de terem um lugar para se abrigar, receber doações ou até mesmo fazer uma refeição. 


Ao perceberem a enorme desorganização da prefeitura de Nova Iguaçu para dar um direcionamento às vitimas, e depois de suspeitas de uma fake news prometendo dinheiro para as pessoas atingidas, um tumulto foi se formando em frente ao Cras. A polícia foi chamada, e fazendo jus ao lema “Servir e Proteger”, direcionaram bombas de gás lacrimogêneo para tentar conter (ou massacrar) as pessoas que ali estavam em busca de uma ajuda.  


Não tem como não se comover com as fortes imagens: um senhor caído na rua, apoiado em um carro, quase desmaia por ter inalado o gás lacrimogênio disparado pela polícia. Alguns moradores, em um ato de solidariedade, tentam socorrer o homem. 


Em outro momento, vemos adolescentes, mulheres e idosos se amontoando, desesperados, enfrentando uma barreira imposta pela PM. Tudo isso depois de terem suas casas alagadas, perdido seus bens e de até mesmo terem visto pessoas sendo levadas pela correnteza, desaparecendo no mar de lama.


O tratamento rude e agressivo, por parte da polícia com as pessoas que moram nos lugares economicamente menos favorecidos da cidade se tornou algo comum e corriqueiro, fazendo parecer que é um procedimento, uma conduta obrigatória. 


A inexistência de um plano de contingência para catástrofes climáticas na cidade do Rio de Janeiro só escandaliza, ainda mais, a série de absurdos ocorridos através da falta de planejamento e organização. 

2023 foi o ano mais quente da história, e com o verão sendo uma estação onde naturalmente ocorrem mais chuvas,  já poderíamos ter previsto o que poderia acontecer. Por que nada foi feito? Tenho certeza que, assim como eu, muitos se fazem esse questionamento. 


Indago, ainda: por que os responsáveis pelos órgãos públicos, que de fato podem fazer algo, não conseguem se antecipar? Dias antes dessa tragédia, o nosso governador Cláudio Castro estava na…Disney! Curtindo suas não merecidas férias, e aparentemente sem sinal de internet, porque só ele não sabia que naquela semana o Rio de Janeiro aguardava por intensas chuvas. O coitado do governador teve que ser pressionado a voltar das férias, porque sozinho não consegue pensar e fazer o próprio trabalho. Nem quando pessoas, da cidade que ele (des)governa, estão morrendo afogadas. 



Agora, pensem comigo: quais bairros foram mais afetados? Quem são os moradores desses lugares? Me diz ai, qual é o CEP delas? Me fala o seu palpite… Dica: não é nas zonas mais “abastadas” da Cidade Maravilhosa… 


A palavra racismo é muito bem aplicada para definir as consequências do descaso com a pauta climática nas regiões periféricas. 


Primeiro, porque em sua maioria, são as pessoas pretas e pobres que moram nas áreas mais abandonadas pelo poder público, e que historicamente são as mais afetadas. 


Segundo, são essas pessoas que sofrem primeiro com as enchentes e com os deslizamentos de terra, fazendo com que percam o pouco que tem. 


Terceiro, as pessoas menos favorecidas não possuem recursos financeiros para tentar amenizar os sintomas do calor excessivo, como por exemplo comprar um ar condicionado, ter uma geladeira que aguente o calor e até mesmo morar em uma casa com a infraestrutura necessária que comporte uma família confortavelmente e com dignidade.



Se você não entendeu ainda o ponto desse texto, sugiro colocar a mão na consciência e voltar a leitura. 


Não podemos esvaziar a discussão sobre o racismo e como a sua estrutura se desdobra por onde passa. Estamos falando de uma configuração que privilegia uma pequena parte da cidade e que abandona todo o resto. 


Não poderia deixar de notar que no domingo, menos de 24h depois do pico da chuva, diversos blocos realizavam os seus desfiles pelas ruas (não alagadas, obviamente) da Zona Sul carioca e do Centro, espalhando muito glitter não biodegradável e em clima de comemoração. 




Isso me faz pensar que a seletividade de uma parte da população no que diz respeito a mobilização social é proposital. O caráter branco, elitista e segregacionista de alguns dos principais blocos de rua do carnaval ilustra o argumento de que o Rio de Janeiro é o Centro e a Zona Sul. 


Um folião branco em um domingo ensolarado na Zona Sul, e o Cláudio Castro curtindo a magia dos parques encantados da Disney, os dois há 80 km/h, são parte de uma elite atrasada, pouco empática e cafona. Nosso governador é um pateta. Essas contradições são um tapa na nossa cara. 



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