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BXD IN CENA: UM ANO DE RESISTÊNCIA, AFETO E ARTE NO CORAÇÃO DE MERITI

  • Foto do escritor: Pivete
    Pivete
  • há 5 dias
  • 7 min de leitura

Atualizado: há 1 dia



Num território onde a arte sobrevive na contramão da política pública, resistir é criar.


E criar, na Baixada, é uma forma de respirar. No meio do concreto, do fluxo da condução e do esquecimento institucionalizado, germina uma das mais potentes iniciativas culturais do estado do Rio de Janeiro: o Espaço Cultural BXD IN CENA. Localizado em São João de Meriti, o espaço completa seu primeiro ano de vida com uma agenda intensa de celebração — e de reafirmação daquilo que já sabíamos: a Baixada não só produz cultura, ela é cultura.


Na cidade que possui um teatro, um museu e um histórico robusto de repressão às expressões culturais de rua, o BXD IN CENA é uma anomalia bonita. É sopro no deserto, é chão firme onde antes era só areia movediça. É rota alternativa.



“O que temos nos basta”, diria mais tarde seu idealizador.

E basta mesmo. Basta para virar referência, para juntar gente, para mostrar que a margem pulsa.



Jéz, o nome por trás da sigla


Jéz é cantor, compositor e multi artista da Vila Ruth — bairro encravado no coração de Meriti. Mas é também mais que isso: produtor, agitador cultural, visionário. Quando criou o “Jéz Convida”, não pensava que ali germinava algo maior. Era só um convite aos amigos para tocarem junto com sua banda. Mas logo o movimento ganhou vida própria.


“Um dia eu virei pra mim mesmo e disse: ‘po, existem vários eventos acontecendo pela Baixada. E se a gente for neles e perguntar o que a galera tá achando?’”.


Dali surgiu o site, o blog, a agenda cultural, o Prêmio BiC — e por fim, o Espaço BXD IN CENA.


Mas nada veio fácil.


“No início, era eu, Fijó e Bea Domingos, com uma câmera de celular e um microfone. Rodávamos 13 municípios da Baixada entrevistando a galera. Depois ficou só dois, depois só eu. Ia com a câmera, pedia pra se virarem nas entrevistas, depois eu mesmo editava. Famoso bichão memo.”

O Espaço BiC: casa de quem nunca teve casa


A vontade de ter um espaço fixo veio da dor. Da ausência.


“Perdemos as casas de show autorais. Hoje só vemos lugares com projetos covers. Não dava mais pra esperar.” 

O Espaço BXD IN CENA nasceu, então, como uma necessidade de se firmar enquanto território de criação — e não apenas de consumo. Num ano de existência, foram dezenas de saraus, slams, oficinas, exposições, shows e cineclubes.




Mais do que lugar de evento, é lugar de encontro. 


“Temos mais de mil livros doados desde que criamos a campanha ‘traga um livro e leve outro’. Hoje virou rede de trocas e doações.” 

E quando o dinheiro aperta — como aperta sempre — o espaço vira bar pra seguir funcionando. 


“Às vezes confundem a gente com bar, mas é só o jeito que achamos de sustentar o corre.”

Prêmio BiC: um Grammy da favela


Celebrar também é político. E por isso o Prêmio BiC não é só um prêmio. É território. É um aplauso preto, periférico e popular. 


“Tivemos gente indicada ao Grammy Latino que se emocionou mais ganhando o BiC. Teve artista que tocou em Berlim e chorou no palco aqui. É isso que queremos: mostrar que aqui também é lugar de vencer.”

O Prêmio nasceu com a proposta de abarcar diversas expressões artísticas — música, cinema, artes visuais, fotografia.


“Lotamos o espaço. Um lugar pra 50 pessoas com mais de 300 querendo entrar. É a prova de que pertencimento ainda vale alguma coisa.”



A Baixada como vanguarda invisível


“Infelizmente a gente tem que ser melhor que a gente mesmo todos os dias”, dispara Jéz.

“Mas a Baixada é o motor invisível da cultura carioca. Vai ver o line-up do Rock The Mountain, Lollapalooza, Circo Voador... sempre tem um baixadense lá. A gente tá nos beats, nas backing vocals, nas produções. O que falta é que os olhos se virem pra cá.”

E é isso que o movimento BXD IN CENA vem fazendo: colocar holofote onde o Estado só jogou breu. Marcar na pele, no user do Instagram, no nome da cena: BXD.



Celebração de 1 ano: uma semana pra não esquecer


Entre os dias 13 e 17 de maio, o BXD IN CENA realiza uma semana intensa de atividades gratuitas. Tem DJ, tem poesia, tem MPB (Música Popular da Baixada), tem arte de rua, tem mostra de lambe, tem roda de conversa. Tem o corpo e a alma da cena.


📌 MPB – Música Popular da Baixada 📅 Quinta, 15/05 – Com artistas de samba, soul, rap acústico, R&B e mais. 


📌 BXDELAS 📅 Sexta, 16/05 – Line 100% feminino, sob curadoria de Lohanna Alves.


“A ideia é celebrar esse um ano mostrando o que a gente tem feito: dar voz, visibilidade e dignidade artística pra quem constroi a Baixada todos os dias com arte.” — Jéz

SERVIÇO

📍 Espaço Cultural BXD IN CENA Rua Prata, 35 – Coelho da Rocha, São João de Meriti, RJ

📅 Semana de Celebração: 13 a 17 de maio 

📱 Instagram: @bxdincena 



PIVETE ENTREVISTA JÉZ


“A Baixada não quer favor. Quer chão pra pisar.”

A frase final dita por Jéz ainda reverbera depois de nossa conversa.


No seu timbre calmo e olhar firme, há uma mistura de cansaço e força – típica de quem vive da e para a arte na periferia.


Fundador do Espaço Cultural BXD IN CENA, artista múltiplo, produtor, cantor e criador do Prêmio BiC, Jéz nos recebeu dentro do próprio espaço, numa manhã em que a casa ainda carregava o cheiro da última apresentação da noite anterior. Essa entrevista é mais que um bate-papo: é uma caminhada pelos bastidores de uma revolução cultural silenciosa que pulsa no coração da Baixada Fluminense.


Pivete – Antes de tudo: como o BXD IN CENA nasceu?


Jéz – O BXD IN CENA começa lá atrás, com o “Jéz Convida”. Era um projeto em que eu recebia artistas da região pra cantar comigo. Era meu show com convidados, sabe? Eu me apresentei em vários espaços, especialmente em Caxias, e fui sacando que essa coisa do artista da Baixada encontrar outros artistas da Baixada tinha uma potência muito única. E foi daí que nasceu a vontade de fazer o blog, de registrar isso. Eu, Fijó e Bea começamos com um celular e um microfone, rodando a Baixada inteira, de Queimados a Magé, fazendo cobertura de eventos. E era doideira, porque a gente ficava editando, postando, divulgando, e às vezes nem dava tempo de respirar. Aos poucos, o grupo foi se desfazendo, e eu segui sozinho. Foi resistência mesmo, porque a parada só crescia e eu não queria deixar morrer.



Pivete – E o nome? Por que “BXD IN CENA”?


Jéz – Eu queria um nome que fosse um grito. Sabe? Que dissesse: “A Baixada está em cena!”. E não tá em cena como coadjuvante, nem como exceção, nem como caso raro. Tá em cena porque é potência. Porque pulsa. O “IN CENA” era esse chamado. De aparecer. De não ser mais apagado. De dizer “estamos aqui”. Não tem nada de inglês bonitinho, não. É identidade mesmo.




Pivete – O Espaço Cultural surge a partir disso, né?


Jéz – Total. A gente fazia a cobertura, o blog, organizava o Prêmio BiC… mas sentia falta de um lugar físico. Porque o que a gente via era isso: os bares autorais estavam fechando, os artistas da Baixada não tinham onde tocar, os espaços que existiam tinham um custo altíssimo, ou eram em lugares que não respeitavam a identidade da gente. Então a ideia era ter um espaço pequeno, mas nosso. Começamos sem dinheiro, com o que dava. Puxamos na unha. Fizemos campanha, vendemos coisa, pegamos empréstimo. E nasceu. A inauguração foi uma loucura. Mais de 150 pessoas num lugar que mal cabia 40. Mas foi lindo demais. Parecia que todo mundo tava esperando por aquilo há anos.



Pivete – E o Prêmio BiC?


Jéz – Ah, o BiC é uma parada muito especial. A ideia era reconhecer quem faz. Porque a gente se cansou de ver artista da Baixada ser premiado fora, aplaudido fora, e ignorado aqui. E tem muito artista foda aqui. Gente que faz com nada, que movimenta, que forma outros. O BiC não tem grana, não tem glamour. Mas tem respeito. E é isso que importa. Já teve artista indicado ao Grammy que falou que se emocionou mais ganhando o BiC. Isso me destrói por dentro. Porque é isso: quando a gente se reconhece, a gente se fortalece.



Pivete – E os desafios?


Jéz – Cara, são muitos. A gente não tem apoio do poder público, não tem patrocínio fixo, não tem isenção de nada. E ainda tem que lidar com burocracia, com preconceito, com a lógica do “ah, mas isso é só um barzinho”. A galera não entende que isso aqui é um centro cultural. A gente faz formação, faz oficina, faz mostra, faz festival. A gente vira bar às vezes pra pagar as contas. Mas não somos um bar. Isso aqui é resistência, é cultura viva. Tem dia que a gente fecha no prejuízo. Tem dia que enche de gente e falta copo, falta cadeira, falta tudo. Mas não falta vontade.




Pivete – E como você segura isso tudo?


Jéz – Tem dias que não dá. Já pensei em fechar várias vezes. Mas aí vem alguém e fala: “Jéz, foi a primeira vez que toquei meu som autoral” ou “Foi a primeira vez que minha mãe me viu no palco”. Aí eu choro. E lembro por que comecei. A Baixada não pode mais esperar. A gente já esperou demais.



PiveteO que você sonha daqui pra frente?


Jéz – Eu quero estrutura. Quero que esse espaço vire referência de política pública. Que inspire outros. Que vire projeto de formação. Que a gente consiga registrar tudo, lançar um livro, um documentário. Que a gente tenha patrocínio pra respirar. Eu quero que a arte daqui tenha chão firme. Que a gente não dependa mais da sorte ou da boa vontade. Quero que o BXD IN CENA seja um legado.



Pivete – E se você pudesse resumir tudo isso numa frase?


Jéz – A Baixada não quer favor. Quer chão pra pisar.



Num tempo em que ser artista na Baixada ainda é um ato de resistência, o BXD IN CENA nos lembra que arte não é só sobrevivência — é também festa, política e futuro.


E a Baixada, meu amor, nunca foi ausência. É potência.




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