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Papai Noel é um otário nunca deu presente para preto favelado




“Papai Noel é mó otário nunca deu presente para preto favelado. Talvez como um bom símbolo capitalista, ele também despreze os pobres. Sei que é complicado, em algumas comunidades a cor vermelha não seria bem vinda. Mas ele poderia se esforçar um pouquinho para agradar quem necessita realmente de algum presente dessa vida maldita.”

Nossas crianças estão nas ruas, algumas vendendo balas, outras recorrendo ao roubo de bolsas, e muitas vezes sendo afetadas por balas perdidas e encontradas. Infelizmente, testemunhamos casos de crianças sendo vítimas de violência, inclusive sendo espancadas por grupos autodenominados justiceiros em Copacabana. Essas crianças enfrentam circunstâncias difíceis, muitas vezes envoltas em violência, e suas reações violentas podem ser reflexo de uma vida marcada por abusos. Sentem revolta devido à falta em um mundo consumista, o que pode gerar inveja e frustração. Devemos nos questionar: são consideradas crianças por todos? Infelizmente, para alguns, a resposta é negativa. Mas é importante lembrar que, para outros, são crianças, e é fundamental buscar soluções para oferecer a elas um caminho mais positivo e digno.


Em 2023, um total de 51 crianças e adolescentes foram vítimas de disparos de arma de fogo, resultando na trágica morte de 24 delas, conforme relato da CBN em outubro. Apenas no Rio de Janeiro, 24 crianças foram atingidas por balas. No dia 24 de outubro, em São João de Meriti, uma criança perdeu a vida após ser alvejada por três tiros no pescoço. No mesmo incidente, outra criança foi ferida de raspão no pescoço. Estas crianças não são reconhecidas e tratadas como tal; não recebem a devida infantilização. Infelizmente, é possível que alguém tenha cogitado erroneamente que essas crianças eram criminosas simplesmente por pertencerem àquela localidade, sem mencionar a triste realidade da discriminação associada à cor da pele, como discutimos anteriormente em outro texto.


Ser criança é um privilégio para poucos. As novas gerações, incluindo a nossa, tiveram a oportunidade de experimentar a infância. No entanto, a própria concepção de infância é algo relativamente recente; somente no século XVIII, com o surgimento do sentimento de infância, é que essa concepção se solidificou. Esse 'sentimento de infância' não está relacionado a gostar ou não de crianças, mas sim à consciência da singularidade infantil, aquela que distingue essencialmente a criança do adulto, mesmo sendo jovem. A infância é uma construção social que precisa ser preservada e cultivada. Não podemos permitir que nossas crianças continuem no processo de adultização e perda de inocência.



Em 2020, celebrou-se a criação do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), um estatuto estabelecido em 1990, que conferiu às crianças e adolescentes o status de sujeitos de direitos e garantias fundamentais. A doutrina da proteção integral determina que esses indivíduos estão em uma condição de desenvolvimento diferenciado, tornando-os sujeitos de absoluta prioridade. A responsabilidade por assegurar uma infância e adolescência protegidas e dignas é compartilhada entre o Estado, a sociedade e a família.


Antes do advento do ECA, vigorava o Código de Menores, uma legislação voltada exclusivamente para crianças e adolescentes em situação de risco, muitas vezes estigmatizadas como 'delinquentes'. Por essa razão, a expressão 'Menor' é tão estigmatizada.

Era ainda mais comum ver crianças trabalhando, privadas do direito à infância, impossibilitadas de brincar e desprovidas do direito de serem crianças. É evidente que, mesmo com a criação do Estatuto, nem todos os problemas foram resolvidos, mas ele se tornou um instrumento fundamental para reivindicar os direitos das crianças e adolescentes brasileiros, principalmente aqueles que vivem em áreas periféricas, são negros e enfrentam condições de pobreza. São essas crianças que, infelizmente, muitas vezes não serão contempladas com presentes e não terão a presença do Papai Noel em suas noites de Natal.


Um estudo conduzido pela ONG Visão Mundial revela a presença de 70 mil crianças em situação de rua em todo o Brasil, durante o ano de 2019. Apenas em São Paulo, esse número chega a 1.700 crianças. Esses menores têm idades que variam de 3 a 17 anos e enfrentam condições de extrema violência, conforme evidenciado pelos dados da pesquisa. Os resultados indicam que 51% das crianças vivem em situação de extrema violação de direitos. Cerca de 19% dos entrevistados afirmaram que passam fome. Além disso, 37% declararam ter sido vítimas de algum tipo de violência, enquanto 70% sofreram violência doméstica. O estudo revela ainda que 12% dessas crianças estão envolvidas em trabalho infantil. E olha só, quem diria, 79% informaram nunca ter tido envolvimento com furtos ou roubos.


Essas crianças são rotuladas como criminosas, embora tenham tido seus direitos de infância roubados pela miséria e violência. Diariamente, são humilhadas e desumanizadas nas ruas dos centros urbanos do Brasil. Quando se revoltam e respondem com violência, são cobradas, sem querer generalizar e compreendendo que há diferentes casos. No entanto, é evidente que o que está ocorrendo, especialmente nas calçadas de Copacabana, não é algo novo e muito menos espontâneo. Pode haver quem escolha roubar por emoção, mas a maioria está movida pela fome, que não se refere apenas à necessidade de comida, mas também à carência de consumo em geral.



Observar pessoas felizes com atos de violência que afetam apenas indivíduos negros e desfavorecidos, que não têm envolvimento com tais eventos, é perturbador. Os justiceiros não direcionaram suas ações contra arrastões, que são mais frequentes nos finais de semana; em vez disso, escolheram percorrer ruas vazias em dias de semana, agredindo qualquer pessoa negra que parecesse suspeita. O problema fundamental é que, para esses indivíduos, todos os negros são considerados suspeitos.


Então, Papai Noel, não é necessário dar algo material, nem é preciso entrar na favela. Relaxe, não precisa acender a luz do salão do trenó. Apenas peço que protejam nossas crianças nas favelas, ruas, escolas, kombis... em suas casas. Que façam o ECA prevalecer como uma ferramenta de preservação da infância de milhares de crianças que não têm esse luxo. Espero que em 2024 eu não precise mais escrever sobre o óbvio para tentar sensibilizar alguém. Fé.


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